29 setembro, 2007

doces pecados de sol

Sacudo mais uma vez a toalha (são tantas e a areia que não desiste!). Sob um dos guarda-sóis, que se amontoam em cores, comem-se doces talhadas de melancia.
-Qu'est que c'est ça maman?
Pergunta um dos petizes depois de uma enorme trinca no fruto rosado.
Ao lado uns olhos grandes sorriem para mim
- Olá! - dizem os dentes pequeninos... pequenas pérolas. O João Paulo parece gostar de areia e de praia e de mar. Com uma camisola laranja, grande demais para o seu corpo franzino, corre em saltos em volta das conchinhas de plástico. Parece saltitar por entre as imensas dunas criadas pelos pés que passam. Não deve ter mais de quatro anos. Quer ir ver as ondas e os barcos que navegam no horizonte. O chapéu de pala ao lado não incomoda a missão... nem a voz do pai que o chama incessantemente quando começa a caminhar. O João Paulo não conseguiu chegar à meta e, como que à tira colo, regressa ao ponto de partida. atira-se para o chão, deita-se na toalha e faz uma daquelas birras típicas da idade em que não se aceitam contrariedades menores. O pai desiste. Afinal, também ele quer um pouco de mar para lavar tantos pecados de sol.
Mãos dadas
Passos certos
Mais uma onda...


"Porque os frutos maduros são doces?"

Beijos violeta borboleta

P.s.: esqueci o beijo que ainda me faz cócegas no coração
P.s.2: novo blog de trenguices, parvoíces e outras 'ices em http://wwwf-util.blogspot.com

04 setembro, 2007

asas brancas

Quero folhas brancas para escrever. Folhas sem manchas ou passado, lisas ou em quadriculado. Linha após linha, preenchem-se os espaços de sentidos e sabores e tantos tantos odores que se perdem em palavras. A caneta vai delizando e as folhas, outrora brancas, estão já marcadas pelos pequenos grãos de areia, pelo sol, pelo sal e por mim.
Hoje sou sombra porque não a tenho. Irradio ondas de calor quando o sol sorri do seu ponto máximo... o meu zénite. Estende-se a toalha, escorre-se o cansaço e distrai-se o beijo em suspenso. À medida que as cigarras aumentam o ritmo do bater das asas - furor! - amainam-se as vozes e no ar apenas o silêncio ondulante do mar. Uma e outra, uma atrás da outra...
Numa cumplicidade de espuma lavam-se os segredos e os gritos roucos entregues em surdina. Entrega-se o corpo à luxúria num acto de carne entre pele e calor.
"- É Ícaro quem está aqui!"
Gritam os velhos de barbas e as musas de outrora e do tempo. Errante, a epiderme continua a oferecer-se... agora com outros aromas e um novo brilho a óleos de amêndoas doces e canela. Paira o pecado cometido em sintonia, esquecem-se as horas cinzentas e as botas de chuva. Até a gabardina amarela, escondida entre mil e uma coisas, parece adormecida da memória.
Contempla-se, esgota-se. É o prazer dos poros que gritam em êxtase sem perdoar! Lá longe continuam as ondas geladas, o líquido frio e salgado...
"- Cheira a mar", diz a menina de tranças loiras e mini-saia cor de pastilha elástica.
Deixe que se cheire e se sinta. Comam os olhos, o nariz, o corpo e tudo!
Planam as asas sem sombra ou luz ou história. Apenas brancas, por escrever...