27 dezembro, 2006

do baú das memórias doces II


(...) “A praia está à nossa espera, vamos lá!”. Não era uma ordem mas o suave pedido de quem queria o já, o agora, o começar naquele mesmo instante por não existirem quaisquer dúvidas sob as ondas doiradas que se iam amontoando na cabeça. “Coragem”, pensava ela. Queria tanto que tudo corresse bem, que os dias fossem de felicidade, que fosse possível caminhar de mãos dadas entre infintos grãos de areia que se moviam, incansavelmente, sob as asas dos pés alterando, aleatoriamente, a paisagem, o presente, o futuro. Enquanto decidia sobre a distância dos sonhos ao mundo real, lembrava a primeira manhã que tinham acordado lado a lado. A imagem ainda nítida do estremecer do corpo dele quando adormecia, da respiração suave e ritmada, de como se aninhava perfeitamente entre os seu braços quentes num enlace que a fazia esquecer de tudo. Havia pouco tempo que se tinham reencontrado... depois de tantas estórias vividas separadamente, o destino tinha-se encarregue de naquela tarde fazer com que se encontrassem, ainda que à distância, num mesmo sítio, na mesma hora e com a mesma vontade de dizer apenas “Olá!”. Pouco mais foi preciso para ela sentir que tinha encontrado o seu reflexo no espelho e... tinha estado sempre ali, bem à sua frente, como as cartas já o tinham dito. Essa primeira noite tinha servido apenas para confirmar o que ja sentia... no quadro criado por um qualquer ente superior, eram as duas peças centrais que se encaixavam sem deixar espaço para mais, apenas lírios e raios de luz numa paisagem bucólica que servisse de fundo, de ambiente. Hoje tinha acordado de surpresa, não contava que um querubim lhe trouxesse o pequeno-almoço como se de um manjar dos deuses se tratasse. Já devia ter esperado por isso, por toda vontade que ele tinha demonstrado de fazer com que os sonhos dela se tornassem realidade, nem que isso implicasse roubar a lua de um céu estrelado, todas as rosas daquele jardim onde numa tarde quente tinham procurado refúgio, sombra, a frescura do verde contrastando com o calor rubi dos amores que se escondiam em seculares ruínas apenas para deixarem na casca da árvore mais uma estória, a sua...
E eram tantas as aventuras que já podiam contar, tantos os beijos roubados e olhares perdidos, as risadas contagiantes, os passos percorridos em largas avenidas e estreitas ruas escuras onde apenas o brilho das duas pequenas lagoas que ele carregava no rosto a impediam de desaparecer. “Toca a levantar, preguiçosa!”, sussurrou baixinho ao ouvido, causando cócegas no coração e despertando-a desse mundo mágico e transcendente que é a lembrança. É então que ela se decide a enfrentar o sol, a praia, o mar, a música do dia que os esperava. Afinal, este iria ser, concerteza, um bom dia!

2 comentários:

Joana M. Soares disse...

...a distância dos sonhos ao mundo real...brutal!!

Anónimo disse...

Um bom dia para ti. Quem escreve assim não é gago, não... :)